sábado, 25 de abril de 2009

desvanecer

no fundo, tudo será a poeira
dos dias que atrás dos dias irão ficar.
o eterno girar do mundo,
indiferente ao meu sonhar.

somente o vazio me sobreviverá.
uma história,
contada em gestos ensaiados, olhares…
nada perdurará
para além da efémera substancia da memoria.

nada valeu
o sentir do que se fez nascer.
esta solidão é um mundo muito meu
nele vou definhando,
num lento, mas inexorável desvanecer.

restam-me somente imagens,
distorcidas pela saudade.
persistir, sem um norte definido, nas minhas viagens.
estremecer com a dissimulação da verdade.

bárbaros tempos estes…
pesam-me sobremaneira nos ombros.
esperava-te e não viestes…
tento agora emergir dos escombros.

como se diz um adeus que se não deseja,
e se vai deixando para trás
a parte maior de nós?
amarga todo o lábio que me beija…
é amordaçada em silêncios que tenho a voz.


leal maria

quarta-feira, 22 de abril de 2009

o esboroar do sonho

no lento esboroar-me pelo sonho
persistem feéricas luzes
diluídas em tanta incerteza
e a profecia de um deus medonho
que outrora teimou em ungir-me a cabeça

mas há qualquer coisa de desespero
nesta minha impaciência para com o fluir dos dias
inexistente a cidade que realmente quero
adultero-me em outras geografias

e o mais das vezes, muito amiúde
percorro a exacta distância
que vai do egoísmo à virtude
num deslumbre de cores e circunstância
embriagando-me em desejos de plenitude

mas já perdi todas as razões
meus argumentos há muito caducaram
cansado de remar contra as multidões
acomodo-me às quimeras que outros acharam

entre a esperança e a desilusão
resta-me a etérea substancia do vazio
naquele país do perfeito verão
deixo o sonho da ideal cidade preso por um fio


leal maria

terça-feira, 21 de abril de 2009

o silêncio dos gestos

é nos silêncios dos gestos
que me habitas num mal contido desejo
e tornas inócuos todos os manifestos
no lábio em que amordaças o beijo

um morrer e renascer constante
a persistente ideia no pensamento
passado e futuro equidistante
olhar que torna único o momento

és-me luz e escuridão
numa pornográfica promiscuidade
o suave toque da mão
tornando-me insuportável a saudade

és o frémito que me percorre o corpo
antecipado ao prazer que não haverá
meu olhar que perscruta o horizonte
procurando o que de ti nunca a mim chegará

és meu sonho sepulto em fantasia
génese de toda a possível aventura
o murmúrio da imperfeita poesia
a promessa de uma improvável ternura

em cada frase que por ti soltei
um elo mais acrescentado à minha prisão
pelo verbo me ergui e pelo verbo soçobrei
e por ele de novo emergirei da solidão


leal maria

sábado, 18 de abril de 2009

Anarquia

tudo agora nos invade
tudo nos impele para o imediato instante
tão para cá da mais óbvia verdade
sempre com a necessidade
de uma tosca retórica que nos levante

a alma foi-nos esquartejada
ao corpo vendemo-lo por dá cá aquele sentir
a quimera foi à força forjada
e o vã motivo no abismo nos fez cair

agora
é tempo de ver voar as pedras da calçada
as fúrias habitando todos os rostos
a insanidade no poema anunciada
os anarcas de sentinela em todos os postos

às aldeias vilas e cidades
alimentá-las-emos com a substancia da poesia
serão o ventre onde germinarão as vontades
e nelas reinará a imprevisível anarquia

vem comigo meu amigo
há muito cantamos todas as canções
chegou o tempo de conseguirmos o que persigo
é tempo de deixar ribombar os trovões

a matilha encontra-se desprevenida
sôfregos
empenham-se em cravar ainda mais os dentes
pouco lhes interessa a vida que é destruída
não querem saber da indignação que sentes

por isso vocifera toda a tua raiva
e rejeita resoluto
todo o dogma onde te querem espartilhar
o velho governar está devoluto
é tempo de o nosso querer reinar

o substantivo o adjectivo e o verbo
serão os pilares desta nossa nova ordem
ninguém de ninguém será servo
nem deixaremos que deste sonho nos acordem

que podem eles se lhes dizer-mos: não!?
que podem eles fazer-nos se de nós somos senhor?!
nosso pai é o singelo e ensanguentado chão
retribuiremos o ódio com ódio e amor com amor


vem comigo amigo
não é novo o tempo que chama por nós
são promessas de justiça que há muito persigo
o sonho e o desejo de que sejamos a sua voz


leal maria

terça-feira, 14 de abril de 2009

a mão deserta

que sei eu afinal?
ou melhor: que sabemos nós?
sempre enredados no condicional…
amordaçados… e são tantos os nós!

mas esperamos o quê?
nada! não há um só alento que nos dê!
afinal não chegaste tu nem eu…
e simplesmente nada
foi o que se nos prometeu .

é de vazio que se fazem os nossos dias!
sempre à espera…
o segredo na mensagem subliminar…
e as noites continuando tão frias;
pela a ausência dos corpos
onde nossos sonhos iriam desaguar.

que estranhos dialectos
são estes que entre nós falamos?
que estranhos afectos
em tão grande desespero buscamos?

com a esperança soçobrada à resignação
há um tempo que vai ficando por cumprir.
olha-se aberta a nossa mão
e sabe-mo-la eternamente deserta
porque a que a iria agarrar não chegará a vir

lentamente;
é um capitulo inacabado que se fecha…
o verbo não encontra o seu lugar nesta história.
entrega-se os pontos;
abandona-se o que se deseja…
remetem-se os sonhos
para um canto esquecido da memória…



leal maria

Nova Israel

o gesto…
o singelo e ténue sinal que afinal não vem
o desejado dialecto
a minha infrutífera espera de alguém

e o desespero
nele me consumindo em todo o acto
o sonho que ainda espero
à revelia da esperança esmagada pelo facto

mas quero dançar com a loucura
quero diluir-me no vento
entre o gemido de prazer e a palavra de ternura
quero o alucinar no sentimento

apodero-me de todo o corpo como uma maldição
entre o desejo e o divino pecado
o olhar o céu e o beijar o chão
trilho o caminho que ainda não foi rebelado

que interessa a ausência
no fundo a carne não é mais que o fim adiado
e de nada lhe valerá toda a ciência
se não se substanciar no que é sonhado

nos corpos onde meu sémen depositei
nascerão nações de nome incerto
e aquele que nelas germinar será rei
sem ter que atravessar nenhum deserto

reinará sobre as suas coisas diversas
de címbalos, em sua honra, ecoarão belas melodias
administrará com justiça as acções perversas
e os súbitos cantar-lhe-ão belas poesias

intitular-se-á deus trota-mundos
os céus fundir-se-ão em turbilhão com a terra
e dos abismos mais profundos
vociferarão os medonhos gritos da minha derradeira guerra

então, depois, descansarei
olhar-te-ei bem lá no fundo das minhas memórias
e o teu nome também eu o escreverei
e aí, sim… será o culminar de todas as histórias



leal maria

sábado, 11 de abril de 2009

ancestrais melodias.. cantos da terra

são ancestrais melodias
que me sussurram coisas de saudades
anátemas sobre esquecidas poesias
onde foram sepultadas velhas verdades

escuto-lhes todos os gritos da terra
prenhe de tantos corpos caídos na dor
frutos maduros de uma perpetua guerra
amargas mãos que se amortalharam em suor

rezei a todo aquele que deus se proclamou
foi certo cuidar-lhe dos filhos
mas nesse sonho que em mim perdurou
achei o azimute que me indicou novos trilhos

e vai já longa esta minha jornada
tanto ficou para trás daquilo que eu era
mas entre o horizonte e uma estrada findada
aguardo sempre ansioso uma outra primavera

ainda que me saiba a delicado mosto a morte
fruo as coisas ao sabor dos ventos
há muito desisti de procurar a boa sorte
há muito desisti de decifrar sentimentos

ao chão que é ao chão que eu pertenço
nele fiz do teu ventre a albergaria de minha alma
e o poema que o simples verbo fez tenso
trouxe-me de novo uma obstinada calma

aceito a fatalidade das coisas acontecidas
mas reservo-me o direito de talhar os meus amanhãs
sou todas essas coisas vividas
mas aos vindouros “paraísos” trincar-lhes-ei todas as maçãs



leal maria

sexta-feira, 10 de abril de 2009

alma prostituída

era o sal... sim foi o sal
esse sal que na tua pele eu sentia
que perdurou para lá do final
do ímpeto com que o teu corpo nu eu cobria

perdurou ainda depois de morrer o beijo
sobreviveu à tristeza do anunciado adeus
independente do efémero desejo
soube reinar sobre os teus sonhos fazendo-os meus

impregnou-me a memória
deixou-me nos sentidos a marca do teu sabor
fantasia premonitória
em que o tesão deu lugar à nostalgia do amor

foi esse sal que me encerrou nos lábios
tudo aquilo que ficou por dizer
nada me valeu a pretensa sabedoria de sábios
perante as tuas confissões nos gemidos de prazer

sobrevém-me agora um remorso
de não saber atenuar a tristeza em teu olhar
mas nunca poderia dizer-te que o futuro era nosso
se há muito abdiquei de ser servo do amar

sou um moribundo
mercenário dos sentidos em corpos alheios
entre o superficial e o profundo
vou até ao fim deitando mão de todos os meios

o teu corpo foi mais um cais de chegada
posto intermédio para a minha perdição
um abrir de porta que se encontrava fechada
fuga em frente na recusa de toda a salvação

mas foi o sal
sim! foi o sal na lágrima no teu rosto
querendo resgatar ao limbo a minha alma prostituída
e as cores daquele sol posto
trazendo-me de volta a recordação
de uma outra nuance da vida


leal maria

domingo, 5 de abril de 2009

see deeply in the skies your destiny

see deeply... in the skies
not de clouds but the hope
which arises
in the brightness of your eyes
when you try to break the rope

many found answers before you
in love in family
even in the words of a book
and they thought they knew what to do
trying changes
with a new soul or a new look

but you still lost
trying to bring your life a glorious day
nobody sees how much cost
to do things your own way

go baby go strong
right to the end of an eternity
sing low an unknown song
put yourself
face to face with your own destiny

shout the maximum you can
you must give fight to illusion
clarify all things which you don't understand
enter deeply into the feelings confusion

no matter the amount of your tears
crying is not a suicide
close your soul to all fears
just put all you have inside

you know what the future is
is just a blank sheet
write it with your own hand
see where you put your feet

go baby go strong
right to the end of an eternity
sing low an unknown song
put yourself
face to face with your own destiny




Author: leal maria

sábado, 4 de abril de 2009

um rosto um olhar um poema

procuro entre a multidão
um rosto um olhar um poema
procuro uma essencial canção
a melodia de um perfeito fonema

busco algo mais
mas no fundo não sei o que é
um outro mundo para ser descoberto
o meio termo entre o longe e o perto
uma enchente de maré

quero um verbo
que me dê sentido ao verso
o egoísmo
num corpo ardente de desejo
a mais ínfima partícula
do primordial átomo do universo
ser todo o lábio
que saboreia um beijo

peço fé
e a couraça da imensa coragem
o intuir do rumo o prosseguir da viagem
a ilusão de quem só vê no mundo encantos
ser amantíssimo dos medos e dos espantos

quero o azul do mar
quero a linha do horizonte
ser o estratega da final batalha
a profecia que nunca falha
fresca água de toda a fonte

quero deitar-me com a mentira e a verdade
fazer um filho ao firmamento
quero a dor da saudade
quero a imortalidade do sentimento

quero a graciosidade e a valentia do equídeo Buçéfalo
ser o espartano o escudo o elmo e a espada
o mítico grifo bicéfalo
ser um novo César de cabeça laureada

quero ser Alexandre ser Napoleão
O Gama em demanda da índia num caminho d´águas
legionário de sétima legião
a lágrima que revela as mais secretas mágoas


quero ser o tudo e o nada
o aleatório entre o azar e a boa sorte
quero ser a obra inacabada
estar p´ra lá da vida e da morte

esventro-me na alma à procura da revelação premonitória
procuro a eternidade nas vãs efemérides da história



leal maria

sexta-feira, 3 de abril de 2009

quimera

subitamente…
omnisciente ao mais ínfimo pormenor
disseco-me pensamento em pensamento
hierarquizo-me do menor ao maior

efémeras
nascem e morrem em mim muitas vontades
oscilo entre o regozijo e o lamento
mergulho promíscuo entre fastios e saudades

se algum amor há que agora dou
em igual dose de desprezo pago também meu tributo
não se renovam os sonhos que antes em mim se sonhou
há tempestades assolando-me o espírito que presumo arguto

e tu… já substância de mim
desafias o tempo perpetuando-te na minha memória
sobrevives ao próprio fim
incrustas-te na minha história

nos dias em que me atormentava a tua ausência
quantas esperanças não sobreviveram à espera
o desencanto na sua mais pura essência
resignado sofrer de quem desespera

mas hoje nada disso me sobrevive
quero sentir-te a falta e já não consigo
transfigurei-te nessa ideia que em mim vive
encarnaste a eterna quimera que persigo

amo o que de etéreo em ti se substância
amo aquilo que não podes deixar de partilhar
a recordação desse teu olhar de poesia
e a tua voz que fiz o som do meu mar

não serás nunca o abraço aberto
que me esperará num cais qualquer
não serás o oásis do meu deserto
nem tampouco te direi minha mulher

serás apenas e só o imenso desejo
corpo de uma alma para mim impermeável
a promessa não cumprida de um beijo
a linha do horizonte inalcançável



leal maria

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Revolução

olhai companheiros,
como inchados pelas contumazes arrogâncias;
nos dizem, enfáticos, serem os primeiros,
independentemente das circunstâncias!

olhai como desejam as carnes dos nossos filhos!
vede o gosto com que antecipam o chuparem-lhes os ossos!
como sempre o foi, assenhorearam-se dos nossos trilhos...
e os lombos onde o seus mundos se apoiam são os nossos!

aaah… não me digais,
que viver acocorado seja um preço justo!
se tal permitir possuíres carro; casa…
e a ultima tecnologia que acolhestes aos gritos.
sei que com o caos vem o incómodo e o susto;
mas é esse definhar na mansidão,
que vos traz em cuidados e permanentemente aflitos!

há uma altura em que nada muda a não ser com destruição!
há uma altura em que tereis de dizer que vos fartastes!
olhai e vede tão vazio o que era já vazio na vossa mão...
e nem podereis dizer que a peçonha fostes vós que a matastes.

hoje degustam-nos com subtilezas...
ofuscam-nos as suas reais intenções nas entre-linhas.
tão seguros estão nas suas intemporais certezas,
vendo-nos embriagados com o cheiro a mosto das suas vinhas.

sim, eu sei, amigos...
é como dizeis… tento lançar-vos a fúria!
eu profetizo uma justiça redentora pelo castigo.
o que torna toda e qualquer acção espúria;
porque se alimenta do ódio extremo ao inimigo.

mas que vos deu a fraternidade e a concórdia?
tendes apenas o fraco consolo das pequenas vitórias!
amorfos, deixai-los reinar lançando-vos em discórdia;
iludidos com as suas encantatórias histórias.

cerrai os punhos e fazei compactas as fileiras!
entrincheirai-vos na força da vossa vontade!
que as razões da indignação sejam p´ra nós as verdadeiras...
e tomemos de assalto novamente a cidade!

sobre corpos caídos alicerçaremos uma nova ordem;
fertilizando com o seu sangue
os campos onde nascerão os novos amanhãs.
esmagá-los-emos, para que de novo não acordem;
e aos velhos paraísos trincar-lhes-emos todas as maçãs.

será o nascer de um novo mundo!
virginal pureza em tudo o que nele germinar!
o retorno do universo ao seu primeiro segundo...
corpo de uma outra Eva que iremos fornicar...



leal maria